Americanas vira caso de polícia. Veja quem é o ‘menino de ouro’ de Lula. Também nesta edição: gigante global prevê guerra por alimentos e uma dica de leitura para entender a gestão de Lemann, Telles e Sicupira quando não havia a crise da Americanas.
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O ex-presidente da Americanas Miguel Gutierrez e a ex-diretora Anna Saicali estão agora na lista de foragidos da Interpol. A Justiça autorizou a prisão preventiva dos executivos a pedido da Polícia Federal.
Entenda: eles comandavam a antiga gestão da Americanas, suspeita de promover uma fraude de R$ 25 bilhões enquanto mascarava as finanças da companhia.
↳ O caso veio à tona no começo de 2023, quando o recém-chegado ex-CEO Sérgio Rial divulgou as irregularidades antes de renunciar ao cargo.
Ninguém aqui. Cerca de 80 policiais foram às ruas do Rio de Janeiro para cumprir os mandados de prisão. Veja o vídeo. Os dois, porém, estão fora do país. Gutierrez há mais de um ano, Saicali há 15 dias.
↳ Miguel Gutierrez tem cidadania espanhola e está no país desde o ano passado.
Segue o esquema. A lavagem de dinheiro continua, o que motiva a prisão preventiva, segunda Polícia Federal. Os crimes também incluem informação privilegiada, manipulação de mercado e associação criminosa. A pena pode chegar a 26 anos.
Relembre o caso. A Americanas está em recuperação judicial desde que a fraude foi revelada. A empresa ainda tenta entender a real situação de suas finanças, com revisão dos dados. As alterações teriam começado em 2007.
↳ Uma das formas de mascarar as finanças era omitindo alguns tipos de dívidas, principalmente com fornecedores, o chamado risco sacado.
Recuperação. A empresa demitiu, fechou lojas e propôs reestruturação. Seus acionistas de referência injetaram R$ 12 bilhões. Entre os credores estão grandes bancos, donos de R$ 42 bilhões em dívidas.
Lemann, Telles e Sicupira, os três acionistas de referência da companhia, negam qualquer conhecimento na fraude feita pela antiga diretoria e estão, até agora, fora do alvo da Polícia Federal.
O presidente Lula chamou Gabriel Galípolo, diretor de Política Monetária do Banco Central, de “menino de ouro” e afirmou que ele tem condições de assumir a instituição depois de Roberto Campos Neto.
Por que importa? O petista terá que escolher um novo presidente da autoridade monetária. Galípolo é o favorito, apesar de ter votado pela interrupção da queda da taxa Selic–ao contrário do que pedia Lula.
↳ O voto foi bem-visto pelo mercado financeiro, que destacou a unanimidade no Copom, o que reduziu resistências ao seu nome.
↳ Com o elogio do presidente, em entrevista à rádio Itatiaia nesta quinta (27), ele parece estar bem avaliado em ambas as esferas.
O menino e o rapaz. Campos Neto, com mandato até 31 de dezembro, costuma ser chamado por Lula por um termo parecido ao usado nesta quinta: “rapaz”. O tom, porém, é sempre de crítica, como aconteceu às vésperas da última decisão sobre os juros.
Quem é Galípolo? O diretor de Política Monetária é economista com graduação e mestrado pela PUC-SP. Ele tem 42 anos –na média de outros presidentes de bancos centrais–, foi auxiliar de Fernando Haddad na Fazenda em 2023 e colaborou com a campanha de Lula.
↳ Antes, foi presidente do banco Fator, o que contribuiu para seu bom trânsito dentro do mercado financeiro.
O que ele pensa. Ele é próximo de Luiz Gonzaga Belluzzo, nome à esquerda dentro do pensamento econômico, com quem escreveu três livros, e visto como um “heterodoxo light”.
↳ Reportagem de Alexa Salomão perfilha o preferido de Lula e analisa suas principais publicações. Recomendo a leitura aqui.
Para entender: dois textos de economistas sobre as diferenças entre heterodoxos e ortodoxos.
Ortodoxo é um péssimo termo para designar um grande e diverso grupo de pesquisadores, explica Bernardo Guimarães, professor da FGV EESP e colunista da Folha (texto de 2023).
Caminhamos para uma “guerra alimentar", de acordo com um dos maiores traders de commodities agrícolas do mundo. Quem faz o alerta é o diretor-executivo da Olam Agri, empresa sediada em Cingapura.
↳ As tradings fazem a intermediação entre agricultores de todos os tamanhos e a indústria alimentícia.
Entenda: as tensões geopolíticas em alta e as mudanças climáticas poderiam levar os países a conflitos por suprimentos, de acordo com o executivo Sunny Verghese. E a reação dos produtores ao cenário potencializa os riscos.
A Olam Agri cita 1.266 barreiras protecionistas criadas em 154 países depois da invasão da Ucrânia pela Rússia, o que dificulta exportações.
Em 2022, a Indonésia limitou as vendas de óleo de palma, e a Índia fez o mesmo com o arroz em 2023. Os dois são produtos básicos na alimentação.
Mudanças climáticas. Alteração nas chuvas e ondas de calor são as principais ameaças à segurança alimentar. O impacto negativo do clima na atual safra agrícola brasileira é estimado em 6% pelo IBGE, com queda de 315 milhões para 296 milhões de toneladas.
↳ O azeite de oliva também é atingido. Secas na Espanha diminuíram a produção e elevaram os preços. No Brasil, o óleo subiu 50%.
Tragédia gaúcha. As enchentes no Rio Grande do Sul, principal produtor de arroz no Brasil, reacenderam o debate sobre redução de estoques e alta de preços do produto.
↳ O governo brasileiro tentou realizar leilões para importação do grão, mas irregularidades no primeiro processo levaram ao cancelamento.
↳ Produtores gaúchos e a Confederação Nacional de Agropecuária afirmam que não há risco de faltar arroz.
📚 Para ler:
“Sonho Grande”, de Cristiane Correa, editora Sextante, 264 páginas.
Os nomes de Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira voltam ao noticiário toda vez que o caso Americanas tem uma novidade.
A dica de leitura é o livro “Sonho Grande”, da jornalista e escritora Cristiane Correa, que conta a história dos empresários, principais acionistas da Americanas desde os anos 1980.
Os três bilionários, que estão na lista de pessoas mais ricas do mundo, são conhecidos também pela criação da Ambev a partir da fusão entre Brahma e Antarctica em 1999. Sua empresa de investimentos, a 3G Capital, controla outras empresas como Burger King e Popeyes.
Lançado em 2013, “Sonho Grande” não detalha o negócio e as fraudes na Americanas, mas mostra o estilo de gestão e a visão dos investidores. As empresas foram montadas com a cultura de meritocracia e rigor com custos.