| Há algum tempo você está de olho em um apartamento que preenche todos os seus requisitos, com exceção de apenas um ponto. O bairro é legal, próximo do seu trabalho e o condomínio tem todas as coisas que a sua família precisa. Mas o preço acima do seu orçamento impedia você de realizar o sonho. Até que, no meio do ano passado, começaram a acontecer alguns eventos climáticos extremos. Enchentes e queda de árvores provocaram constantes interrupções de energia e problemas de trânsito nos arredores. Em poucas semanas, alguns moradores começaram a ficar com medo de que isso continuasse a acontecer para sempre, e decidiram correr para a imobiliária anunciar seus apartamentos. Como você deve saber, se muita gente começa a vender, os preços caem, e o apartamento que você estava de olho ficou 20% mais barato em questão de semanas! Eu tenho certeza que você e quase todas as pessoas que estivessem nessa condição iriam encarar essa queda de preços como uma oportunidade imperdível, e ficariam mais propensas a comprar. Mas por que, quando o assunto são as ações, as quedas provocam um sentimento oposto nas pessoas? Elas tendem a afugentar os investidores, ao invés de fazer eles enxergarem a situação como uma oportunidade. Não era um apartamento Como você deve suspeitar, não falo apenas preços de um apartamento, mas também de uma ação: a SLC Agrícola (SLCE3). Depois de anos muito bons para o agronegócio brasileiro, 2023 marcou uma reversão do sentimento. Para começar, o preço da soja e do milho despencaram, reflexo de uma grande sobreoferta global, juros elevados ao redor do mundo e menores perspectivas de crescimento dos maiores países consumidores. Isso atrapalhou as produtoras agrícolas de maneira geral, mas as brasileiras acabaram sofrendo ainda mais, por conta do clima extremamente quente no Centro-Oeste e bastante úmido no Sul do Brasil, ocasionados pelo El Niño. Com sinais de quebra de safra já no início do período de plantio, investidores entraram no modo pânico e começaram a vender as ações. E como as ações não são apartamentos, ao invés de ver ali uma oportunidade, investidores ficaram receosos com as quedas e deixaram SLCE3 largada. |
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Quando quedas são oportunidades É óbvio que nem todas as quedas podem ser encaradas como oportunidade, afinal de contas, algumas vezes isso acontece porque o negócio piorou mesmo. Podemos conversar mais sobre "quedas que não são oportunidades" em uma próxima coluna, mas o que eu quero mostrar hoje é que, algumas vezes, quedas mal interpretadas podem gerar ótimas oportunidades pensando no longo prazo, desde que a qualidade da empresa continue intacta, e os resultados não demorem tanto tempo para voltar à normalidade. O caso da SLC parece se encaixar perfeitamente na categoria "quedas que geram oportunidade". A meu ver, estamos falando da melhor empresa do agronegócio brasileiro, com longo histórico de geração de valor para os acionistas – a valorização da ação muito acima do Ibovespa mostra isso. Sim, os resultados recentes pioraram, mas foi por conta da queda do preço dos grãos e da produtividade em função das ondas de calor, não por uma piora na qualidade da gestão. Se a qualidade da companhia parece intacta, temos que tentar entender se vai demorar tanto tempo assim para que os resultados se recuperem. Mais perto do topo do ciclo ou do fundo? Antes de mais nada, é importante deixar claro que estamos falando de preços de commodities, que são impossíveis de se prever. Mas o simples fato de tentar entender se estamos mais próximos do fundo ou do topo do ciclo já pode ajudar bastante. Como qualquer outra commodity, os grãos dependem do cenário de oferta e demanda, e, apesar de a perspectiva de sobreoferta ainda atrapalhar, alguns fatores podem começar a reduzir essa estimativa. Para começar, preços menores tendem a inibir o crescimento da produção futura, o que deveria ajudar a ajustar a balança de oferta e demanda. Além disso, as quebras de safra no Brasil e a crescente possibilidade de um La Niña no segundo semestre deste ano (que afeta grandes regiões produtoras, como Argentina, Sul do Brasil e Estados Unidos) podem jogar essa sobreoferta ainda mais para baixo. Há ainda um aspecto técnico importante: a posição vendida (short) de grandes fundos de trading está próxima das máximas da última década, o que mostra que já há bastante pessimismo nesse momento e abre espaço para surpresas positivas. Nas últimas semanas, temos visto até uma pequena recuperação dos preços da soja e do milho. Obviamente, isso não quer dizer que eles chegaram ao fundo do poço, mas há sinais de que estamos mais próximos do fundo, e uma reversão de preços deveria ajudar a SLC. E se estivermos errados? Obviamente, podemos estar errados e a sobreoferta continuar pesando sobre os preços. E aqui entram os aspectos de valor. Nos patamares atuais, a SLCE negocia por 6,5x Valor da Firma/Ebitda (contra uma média de 8x) e um ótimo nível de dividendos (acima de 6% de dividend yield). Mesmo que os grãos não se recuperem tão cedo, algo que não podemos descartar, o nível de valuation atual é pouco exigente, ou seja, ninguém está esperando grandes resultados de SLC com todo esse pessimismo relacionado ao agro, e isso deveria ter impacto limitado sobre os papéis. Por outro lado, se o cenário melhorar, há um bom upside a se capturar. Por esses motivos, entendemos que esse é um caso de queda que representa uma oportunidade de compra, e por isso a SLC Agrícola passou a fazer parte da série Vacas Leiteiras. Se quiser conferir essa e outras ótimas pagadoras de dividendos, incluindo empresas americanas que proporcionam uma ótima renda em dólar, deixo aqui o convite. |
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| | MAIS SOBRE O AUTOR Ruy Hungria Bacharel em Física pelo IF-USP e possui MBA em Finanças pela Fipe. Iniciou sua carreira na Empiricus em 2011 e participou da elaboração de diversas séries até assumir o Flash Trader, série dedicada a operações com opções. É colunista do Seu Dinheiro. |
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